quarta-feira, 14 de março de 2012

O Matriarcado, terá realmente existido?

Existiu o Matriarcado?

No século XIX, vários antropólogos e até um eminente teórico do socialismo moderno, acolhendo as idéias de Darwin, defenderam a existência num tempo remoto da humanidade do sistema do matriarcado, uma organização social inteiramente predominada por mulheres. Leia a seguir suas principais conclusões.

Uma Mãe de 25 Mil Anos
A "Vênus" do Paleolítico, um ícone
 da maternidade.

A cabeça dela era indefinível, uma bola escamada, sem narinas, sem olhos, boca ou orelhas, mas os seus seios e o seu abdômen eram imensos, inflados, colossais. Tratava-se de um pequena estátua (11.1 cm de altura) encontrada nas proximidades de Willendorf na Áustria, em 1908. Visivelmente era de uma mulher prestes a dar a luz, uma estatueta de uma futura mãe. Chamaram-na ironicamente de Vênus de Willendorf. Posteriormente, o pequeno objeto, submetido às perícias do carbono 14, um quase exato método científico que apura a idade dos achados, revelou que aquela senhora esculpida com as primitivas ferramentas de um Cellini do Paleolítico Superior datava de 24 ou 25.000 anos atrás! Não havia nela nem um só traço de beleza. Nenhuma exaltação à feminilidade ou à graça da mulher. Aquele que a modelou, talvez um xamã, um sacerdote-artista, viu-a apenas na sua função mais natural, a mais primitiva da mulher: gerar filhos. Terem-na cinzelado naquele estado pré-natal, sem nenhuma preocupação estética, segundo os antropólogos, revelava que a exclusiva preocupação daquela remotíssima sociedade, era com a reprodução da espécie. A estátua era um pleito às forças mágicas ou divinas. Desenharam-na redonda, em formas abundantes, porque esperavam que as mulheres dessem filhos e mais filhos à tribo. A mulher era a usina da vida, de cujo ventre saltavam os guerreiros e os caçadores do clã.

A Teoria do Matriarcado

Ter sido a de uma mulher, de uma mãe, a mais antiga estátua até então encontrada na Europa, quiçá no mundo todo, só fez por reforçar as teorias antropológicas do século XIX, que apontavam para a existência do matriarcado, como a mais remota forma de organização social conhecida. O mais singular defensor dessa teoria, a Teoria do Matriarcado, foi o antropólogo suíço J.J Banhofen, um admirador de Darwin. Desde que as idéias do grande naturalista tomaram corpo, com a difusão da Origem das Espécies, publicada por Charles Darwin em 1859, trataram todos de alinhar na história, na religião, na sociologia e na economia numa classificação evolucionista. Como conseqüência disso, pensavam que tudo partia de formações mais toscas e simples para as mais avançadas e complexas, e, claro, mais civilizadas.
Afrodite, Deusa Grega, exaltação
 da beleza feminina.

J.J. Banhofen (Mito, Religião e Direito Materno, 1861), aplicou tal linha progressiva na antropologia. Para ele, as sociedades humanas em seus primórdios eram seguramente sociedade matriarcais. As mulheres, assegurou, dominavam o mundo de então. E a razão disso era muito simples, devido à inerente promiscuidade sexual, que se supunha dominar o comportamento das comunidades primitivas, onde imperava um acasalamento circunstancial, imediato, sem regras ou compromissos estabelecidos, as mulheres, que tinham inúmeros parceiros, eram as únicas a poderem determinar com certeza de quem eram os filhos. Nesse sistema, os homens eram apenas machos reprodutores que não mantinham nenhum vínculo afetivo ou responsável com os recém-nascidos. Para esses só existia a mãe. Ela era o centro e a razão do seu viver.

Segundo Banhofen, que recorreu largamente à literatura clássica, isso explicava não só existência e a persistência dos ofícios, dos louvares e da exaltação às deusas-mães existentes em todas as sociedades, como também à estrutura jurídica derivar da idéia da existência de um Mutterrechts, um Direito Materno, ao redor do qual tudo o mais se estruturou. A evolução da situação, de semipromiscuidade para uma posterior família monogâmica, ocorreu devido à vitória dos deuses masculinos que, progressivamente, foram deslocando os mitos e as celebrações das deusas-mães.

O Matriarcado e o Parentesco
Lewis Morgan,
Um teórico do Matriarcado.

Seguindo na linha dos antropólogos evolucionistas, o americano Lewis Morgan ( A Sociedade Antiga, 1877), defendeu, ao estudar as tribos dos iroqueses, o ponto de vista de que as relações de parentesco eram dadas pelas mulheres, pelas mães (que até hoje encontra-se no antigo hábito ibérico de que o sobrenome da mãe é colocado no final, e não no meio do nome do filho). Conseqüentemente, confirmava-se para ele, a teoria do Direito Materno de Banhofen, como sendo o direito-matriz das sociedades. O que entretanto o suíço deduziu da leitura das tragédias gregas (especialmente de uma notável interpretação jurídica da Orestéia de Ésquilo) e das narrativas mitológicas, Morgan deduziu dos encontros e da observação direta, empírica, feita nas suas visitas às reservas dos índios norte-americanos, generalizando sua concepção da gens, para entender tanto os primórdios das organizações familiares da sociedade greco-romana clássica, como das contemporâneas, da Ásia, da África e da Austrália.

A Propriedade e o Fim do Matriarcado

Friedrich Engels, bem como Karl Marx, entusiasmou-se pelo trabalho de L. Morgan, extraindo dele conseqüências bem mais amplas do que as origens do parentesco e as alterações ocorridas na familiar. Engels (Origem da família, da propriedade privada e do estado, 1884) aceitou também existir num passado longínquo uma sociedade matriarcal, não da mítica tribo das guerreiras amazonas, que tantas lendas gerou, na qual as mulheres dispunham de uma liberdade sexual desconhecida para os modernos.
O mito das Amazonas é a prova de um passado Matriarcal.

Para o companheiro de Marx, entretanto, o surgimento do patriarcalismo e as subseqüentes modificações na estrutura familiar nada deviam à crescente proeminência dos deuses masculinos como pensara Banhofen, mas sim à introdução do princípio da propriedade privada. Com o surgimento do costume do cercamento e da delimitação das terras, adotadas pelos homens vitoriosos em combates e guerras, os machos passaram, disse Engels, a exigir fidelidade sexual das mulheres porque não aceitavam ter de legar os seus bens, obtidos com sangue e pela exploração do próximo, a um descendente que não fosse seu filho legítimo, gente do seu próprio sangue.

Foi então que o adultério feminino passou a ser considerado grave infração, senão crime capital. As exigência do patrimônio enfeixado nas mãos dos homens teriam então suprimidoas liberdades femininas, tornando as mulheres cativas, presas a um casamento monogâmico. De certa forma era inevitável que um militante socialista como Engels concluísse que a opressão feminina derivava em última instância da existência e manutenção da propriedade privada, induzindo a que se concluísse que a verdadeira emancipação feminina só poderia advir da abolição da sociedade burguesa.

Os 4 Princípios Gerais da Teoria do Matriarcado

1 - A única linha válida é a matrilinear, na qual é o sangue da mãe que determina a descendência e as posses da prole.
2 - O lar materno define o domicilio da família. O homem, a mulher e as crianças vivem no local do grupo com quem a mulher se relaciona.
3 - Na ausência de casamentos fixos ou monogâmicos, o papel do pai é assumido pelo irmão da mãe.
4 - A proeminente posição da mulher no culto e na religião. A aceitação de que o patriarcado sucedeu o matriarcado pertence cientifica e historicamente à teoria da evolução do século 19.

Considerações Sobre o Matriarcado

Pesquisas antropológicas feitas com mais rigor no século XX concluíram que jamais houve uma sociedade matriarcal. Isso não significa negar que em várias tribos ou civilizações as mulheres fossem altamente consideradas (como por exemplo na Grécia arcaica). A presença de mulheres nos tronos ou em alguns postos de mando, porém, foram quase sempre fatos isolados, eventuais e vinculados aos direitos dinásticos, pois elas na sua totalidade nunca conduziram ou dominaram inteiramente uma sociedade. Intelectuais vinculadas ao movimento feminista têm realizado inúmeros levantamentos das celebrações e cultos feitos às deusas em diversas organizações antigas, como na sociedade cretense e outras mais. Outras dedicaram-se a abrir um novo espaço de investigação, trazendo à luz o papel significativo que elas exerceram em vários momentos da história antiga ou contemporânea, o que aponta para um futuro onde a participação geral da mulher vai ser inteiramente reavaliado.

   O ensaio de Merlin Stone é um dos exemplos das concepções feministas aplicadas à história da antiga ritualística religiosa



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